Atualizado em 13 de fevereiro de 2020 por Flávia
DEPÓSITOS JUDICIAIS E PRECATÓRIOS
70%!
Esse é o percentual de depósitos judiciais que pode ser utilizado para o pagamento de precatórios. A possibilidade surgiu em 2015, com a Lei Complementar 151/2015. E foi posteriormente inserida no texto constitucional com a Emenda Constitucional 94/2016. Porém desde então a controvérsia é tão grande que coube ao Supremo Tribunal Federal (STF) analisar a questão.
Porque há polêmica?
Os depósitos judiciais são valores depositados no decorrer de um processo, como forma de garantir o pagamento por uma das partes. Em geral, são utilizados quando há risco de que o devedor não cumprirá a condenação (em outro texto, tratamos com mais detalhes as hipóteses de utilização desses depósitos).
Ocorre que, entre a realização do depósito e o efetivo pagamento do credor, há um intervalo de tempo. Isso permite que bancos e instituições financeiras não só façam aplicações com esses valores a taxas diversas, mas também os utilizem para outros fins.
Isso é possível porque as instituições financeiras operam utilizando o mecanismo da alavancagem. Em uma definição mais genérica, a alavancagem seria “o ato de operar volumes financeiros maiores que o seu próprio patrimônio”. Ou seja, quando um indivíduo realiza um depósito em sua poupança ou conta corrente, esse valor não ficará necessariamente “parado”, esperando que seu titular faça o resgate.
Os bancos possuem um patrimônio bem superior às suas necessidades diárias e ainda lidam com patrimônios de clientes. Dessa forma, os bancos podem separar uma parte dos valores depositados para eventuais saques e outras necessidades mais imediatas, utilizando o restante da forma como desejarem. Geralmente, isso significa obter retornos bem superiores aos que serão pagos a seus clientes, gerando lucros. E como funciona isso?
Por exemplo, os valores que o cliente “x” realiza em investimentos podem ser utilizados para fazer empréstimos a outros clientes a taxas maiores ou para o banco fazer outros investimentos mais lucrativos. Quando o cliente “x” solicita seu dinheiro de volta, ele é pago com o dinheiro emprestado por um outro cliente “y” e assim por diante. Em termos gerais, é assim que funciona a alavancagem bancária, o que permite que os valores depositados sofram alterações.
O que a lei diz sobre depósitos judiciais para pagamento de precatórios?
A Lei Complementar 151/2015 determina que, em processos em que estados, Distrito Federal ou municípios façam parte, 70% dos depósitos judiciais devem ser entregues a esses entes públicos. Os valores repassados poderiam ser utilizados, entre outros, para o “pagamento de precatórios judiciais de qualquer natureza”.
Ou seja, mais da metade dos valores dos depósitos judiciais, em processos que envolvem essas entidades, poderiam ser usados também para o pagamento de precatórios. Na prática, isso se assemelharia ao mencionado mecanismo da alavancagem, pois os valores dos depósitos judiciais. Estes deveriam ficar guardados até a decisão judicial, seriam utilizados para outra finalidade nesse meio tempo – como o pagamento de precatórios.
Vale ressaltar que o STF determinou que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) é responsável por regulamentar os procedimentos para os pagamentos. Além disso, cabe ao CNJ monitorar para que os recursos não tenham outro destino, além do pagamento dos precatórios (embora as demais finalidades aceitas fujam ao propósito deste artigo, estão expostas no artigo 7º da lei e, obedecidos os critérios estipulados, podem incluir, por exemplo, o pagamento de dívida pública).
EC 94
O debate foi reforçado no ano seguinte, quando foi editada a Emenda Constitucional – EC 94/2016. Entre seus dispositivos, uma das alterações foi a definição dos procedimentos para a quitação, até 31/12/2020, dos precatórios que estivessem atrasados na data de 25/03/2015. Esses procedimentos seriam aplicáveis a estados, Distrito Federal e municípios, ficando conhecidos como regime especial de precatórios. Nesse contexto, a EC 94 trouxe determinação parecida com a da LC 151/2015, ao afirmar que:
“§ 2º O débito de precatórios poderá ser pago mediante a utilização de recursos orçamentários próprios e dos seguintes instrumentos:
I – até 75% (setenta e cinco por cento) do montante dos depósitos judiciais e dos depósitos administrativos em dinheiro referentes a processos judiciais ou administrativos, tributários ou não tributários, nos quais o Estado, o Distrito Federal ou os Municípios, ou suas autarquias, fundações e empresas estatais dependentes, sejam parte;
II – até 20% (vinte por cento) dos demais depósitos judiciais da localidade, sob jurisdição do respectivo Tribunal de Justiça, excetuados os destinados à quitação de créditos de natureza alimentícia(…)” (grifos nossos)
Assim, surgiram duas possibilidades:
- Processos em que eram partes o estado, o Distrito Federal, os municípios, suas autarquias, fundações e empresas estatais: 75% dos depósitos judiciais poderiam ser utilizados para o pagamento de precatórios;
- Demais processos, de natureza não alimentícia: 20% dos depósitos judiciais poderiam ser utilizados para o pagamento de precatórios.
Embora os percentuais e detalhes da lei possam parecer complexos, a informação mais importante a que devemos nos atentar é a permissão para que depósitos judiciais sejam utilizados no pagamento de precatórios.
A Polêmica
A autorização dada pela EC deu origem a debates e mesmo ao questionamento de sua constitucionalidade. Ou seja, foi necessário analisar se os dispositivos contrariavam ou não a Constituição Federal. Essa decisão é tomada pelo STF e o instrumento legal para o questionamento é a Ação Declaratória de Inconstitucionalidade (ADI). Assim, a ADI 5679 foi iniciada pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
Antes de tudo, saiba que o objetivo de uma Emenda Constitucional é modificar o texto da Constituição ou acrescentar algo novo. Entretanto, existem limites para as modificações, pois a própria CF/88 prevê que algumas de suas partes são intocáveis – as cláusulas pétreas (é possível aumentar esses direitos, nunca diminuí-los).
A PGR não concordou muito
Assim, a PGR afirmou que a EC 94/2016 não seria possível porque ofenderia não só o princípio da divisão das funções estatais, mas também direitos e garantias individuais. Vamos tentar entender o que isso significa.
Em um trecho de sua argumentação, o então Procurador-Geral afirmou:
“Destinar recursos de terceiros, depositados em conta à disposição do Judiciário, à revelia deles, para custeio de despesas ordinárias do Executivo e para pagamento de dívidas da fazenda pública estadual com outras pessoas constitui apropriação do patrimônio alheio, com interferência na relação jurídica civil do depósito e no direito fundamental de propriedade dos titulares dos valores depositados.”
Ou seja, a utilização dos depósitos para os pagamentos representaria uma apropriação do dinheiro alheio, sem consentimento. A pessoa que fosse parte no processo onde ocorreu o depósito, ao ganhar, dependeria de dinheiro disponível para ser paga. Isso atrasaria a duração do processo, prejudicaria o acesso à Justiça e atentaria contra a propriedade privada.
Por tudo isso, segundo a PGR, a Constituição seria violada em cinco pontos:
- Divisão de funções (o Poder Executivo faria uso de valores sob a tutela do Poder Judiciário);
- Direito fundamental de propriedade (pois a apropriação seria feita sem o consentimento dos titulares dos depósitos);
- Direito fundamental de acesso à Justiça (representa o direito a um processo justo, efetivo e de duração razoável);
- Princípio do devido processo legal (garantias que limitam os poderes do Poder Judiciário, evitando arbitrariedades);
- Princípio da duração razoável do processo (direito de que não ocorram atrasos injustificados).
Decisão do STF
Para o STF, a Lei Complementar 151/2015 e a EC 94/2016 possuem destinatários diferentes. Enquanto a primeira seria aplicável ao “regime geral” de precatórios, a segunda seria destinada ao “novo regime especial”.
Assim, o STF determinou que a LC 151 deve continuar em vigor, aplicando-se a todos os no regime comum.
Com relação à EC 94, o STF afirmou que a mesma não ofende a Constituição. Entretanto, a mesma não é autoaplicável. A referida emenda será aplicável somente ao regime especial, mas depende de sua regulamentação pelo CNJ. Enquanto o CNJ não fizer tal regulamentação, será possível que os próprios Tribunais de Justiça Estaduais tomem essa iniciativa.
Em respeito à polêmica levantada pela PGR, foi afirmado que só seria caracterizada a apropriação da propriedade dos particulares se a utilização dos recursos fosse ocorrer indefinidamente. Entretanto, segundo o STF, a EC 94/2016 seria meramente um “instrumento de financiamento temporário”. Assim, seria assegurado que os valores fossem devolvidos até o fim do regime especial, em 2020, garantindo legalidade à emenda.
Resultado da discussão
O tema explorado envolve diversos conhecimentos e debates jurídicos, sendo de alta complexidade. Não é à toa que diversas entidades jurídicas, como PGR, STF e OAB têm discutido o assunto ultimamente.
Com o objetivo de trazer os principais aspectos da discussão da forma mais acessível possível, foi necessário não apenas realizar simplificações. Assim o debate é concentrado nos tópicos mais pertinentes, por vezes ocultando outras questões paralelas igualmente relevantes.
Esperamos, assim, ter esclarecido o tema geral proposto, acrescentando ainda algumas definições importantes. Dessa forma, é altamente recomendável que os interessados busquem aprofundamentos sobre temas específicos abordados no texto.
Boa tarde estou aqui de novo KKK uma dúvida dia 07/11/2018 foi feito um depósito judicial 1 grau ,lá consta valor número da guia .minha pergunta é qual o próximo passo para sacar devo procurar meu advogado ? Ou juiz ainda tem que assinar algo ? É sobre um precatório do INSS marcado para receber em 2018
Olá Aline, seja bem-vinda de volta! 😀
No geral, o juiz tem que emitir um alvará para que o dinheiro seja liberado para o saque. Mas tem casos que isso acontece juntamente com o depósito e outros que demoram mais um pouco. Assim, a principio você pode ir diretamente a uma agencia qualquer do banco onde o precatório foi depositado com toda a documentação necessária. Não precisa esperar o advogado.
Esperto ter ajudado 🙂
Obg agora está bem perto KKK parabéns pela blog..
Bom dia! parabéns pelo site! ele simplifica e explica de forma que pobres mortais entendam esse tipo de assuntoi!
gostaria de saber como faço para receber uma indenização referente à uma invasão na minha fazenda por iíndios e estes roubaram meus gados. este processo é administrativo, está na FUNAI e eles me pediram um parecer sobre juros compensatórios e moratporios. a funai vai fazer esse pagamento através de precatórios e isso tem a ver com a LC 151/2015? o dinheiro virá desses depósitos judiciais? obrigada . estou bem confusa.
“Olá Adriane, tudo bem?
Processo administrativo é uma maneira de tentar resolver mais rapidamente questões que tenham concordância entre as partes. Mas de toda forma, o pagamento será feito em RPV ou precatório, dependendo do valor. Quanto a juros compensatórios e moratórios, sugiro dar uma lida neste artigo para entender um pouco melhor
Espero ter ajudado :)”
Tanto o ex governador Alckmin em abril/2018, como seu sucessor Márcio França em outubro/2018 declararam que iriam pagar 8 Bilhões de reais esse ano de 2018
Que esse dinheiro era oriundo dos depósitos judiciais
Que 50 Pc para acordos 50 Pc para ordem cronológica
Sabe me dizer que fim levou esse dinheiro?
Olá Joaquim tudo bem?
Ainda não foi lançado um balanço de quanto foi efetivamente pago em acordos diretos pelo estado de São Paulo. Assim como os pagamentos por ordem cronológica, cujo grosso dos pagamentos é feito nos últimos três meses do ano. Assim ainda ficamos na dependência de um relatório do TJSP para verificar o quanto foi cumprido das promessas. Creio que até o final do primeiro trimestre de 2019 esses números estarão disponíveis.
Atenciosamente,
Como saber a quantas anda meu precatoria. Tenho os números e não consigo ver. Disse a advogada que é assim mesmo eu tenho que aguardar e que só deve sair no ano que vem. Só preciso saber se ela está certa ou não. Sem mais agradeço
Mauricéia,
Depende do tribunal. Se você não consegue fazer a consulta online, você pode ir diretamente na vara onde o processo foi julgado para fazer a consulta também.
Espero ter ajudado 🙂
Qual o prazo para receber um precatório? Já foi pago pelo TJSP e como faço para saber se o advogado fez o levantamento Judicial?
Guilhermina,
Depende de quando seu advogado pediu o alvará de levantamento. No TJSP pode demorar até seis meses. Quanto a verificar se o saque já foi feito você pode tentar verificar no processo ou então diretamente no banco.
Espero ter ajudado 🙂
Olá, tudo bem?
Se estou sendo desapropriado pelo município, e o mesmo deposita a indenização na conta do processo de desapropriação (depósito em juízo), o dinheiro depositado tem chance de se tornar “precatório”? Ou desde que dinheiro está juízo, e o processo for finalizado ou as partes entrarem em acordo, eu posso solicitar a retirada do dinheiro? É um montante considerável, e já que houve a desapropriação, gostaríamos de finalizar o processo mais rápido possível para que o dinheiro possa ser utilizado para sanar outras dívidas que surgiram diante do contexto.
Anselmo,
O dinheiro depositado em juízo é o valor que eles consideram justo. O precatório sairia apenas de uma eventual diferença entre o valor depositado em juízo e o valor real do imóvel que o juiz confirmou em sua sentença. Sobre um eventual acordo, depende das tratativas na verdade, podendo o dinheiro depositado em juízo fazer parte ou não do valor a ser pago.
Espero ter ajudado 🙂
Uma noite abençoada na presença de Deus. Preciso de uma orientação. Eu tenho uma precatório, que foi depositado no banco do Brasil Rio de Janeiro, infelizmente não consigo receber.
Estou nesse dilema desde JULHO DE 2020. O banco do Brasil está cheio de pessoas despreparada, que não sabem informar nada. Entrei numa fila enorme, fui orientada a me dirigir ao caixa e assim, o fiz. Entreguei os documentos e vindo a resposta que tinha que ter, o oficio do requisição. Me estressei e fui parar na emergência do hospital.
No dia seguinte, telefonei para o banco do Brasil de Alagoas, pois, a ação tramitava pela Vara Federal de Alagoas. Falei com o gerente Sr. Claudio e me dando todas as informações necessárias, forneci o número do CPF, e consta um depósito, que eu fosse a qualquer agência, munida dos documentos. Que não necessita de requisitório e nem de alvará, qualquer obstáculo, que o funcionário entrasse em contato com ele, sem êxito. Para não me estender muito, pois estou me sentido mal O que devo fazer, seria um MANDADO DE SEGURANÇA ou OBRIGAÇÃO DE FAZER. Se o senhor tiver alguma jurisprudência pode me passar. Estou necessitando desse dinheirinho Obrigada. Fátima Rio de Janeiro 25 de maio de 2021
Maria,
Como o gerente te informou não há a necessidade de nenhuma documentação adicional, caso o precatório não necessite de alvará de levantamento. Assim, um mandado de segurança não teria efeito porque, na prática já está liberado. O problema é que recebimento de precatórios não é algo cotidiano em agências bancárias, daí as pessoas realmente não sabem como proceder.
Espero ter ajudado 🙂
Boa tarde!
Ocorreu em 29/12/2020 o depósito judicial do precatório, em que eu e meus irmãos e nossa mãe fomos habilitados em 2016 no processo, pois o titular (nosso pai) faleceu em dezembro/2015.
Devido ao falecimento da minha mãe, foi solicitada em dezembro/2021 a habilitação (eu e meus irmãos) da fração que cabia a nossa mãe.
Peço a gentileza de informar qual é o prazo máximo para ser emitido o alvará de levantamento, pois há quase 14 meses ocorreu o depósito judicial. e ainda não recebemos.
Boa tarde, tudo bem? Obrigada pelo seu comentário!
Quanto a sua dúvida: Não existe uma média de tempo para finalizar esse processo. A partir da liberação do alvará, se ele for totalmente eletrônico basta comparecer ao banco para fazer o saque. Se ele não for, será necessário imprimir e levar ao banco.
Espero ter ajudado, caso ainda tenha dúvidas fique à vontade para perguntar!
Atenciosamente, Equipe Meu Precatório.