Atualizado em 18 de julho de 2023 por Laura Oliveira
A Advocacia-Geral da União (AGU) e o Ministério da Fazenda divulgaram uma minuta de regulamentação para o uso de precatórios no pagamento de outorgas e na aquisição de imóveis da União. Essas novas regras foram consideradas rígidas por empresas, especialistas e membros do governo federal.
O que muda com as novas regras?
- Viabilidade explícita em edital
- Agora, será necessário mencionar nos editais a possibilidade de usar os valores a receber da União, além da exigência de garantia por parte do governo para aceitar os precatórios como pagamento.
- Limite anual:
- Será estabelecido um limite anual para o uso de precatórios, e a entidade pública poderá restringir a porcentagem da dívida que poderá ser paga com esses recursos.
Contexto e mudanças anteriores
Essas mudanças são apenas mais um episódio de uma situação complexa que começou no início do ano, quando a AGU revogou a portaria anterior do governo do então presidente Jair Bolsonaro. Essa portaria regulamentava o uso de débitos judiciais para aquisição de ativos. Desde então, houve várias idas e vindas em agências reguladoras, com algumas delas ignorando a revogação, argumentando que a Constituição já garante essa possibilidade.
Em maio, após discordâncias no próprio governo federal, a AGU suspendeu definitivamente o uso de precatórios como pagamento de outorgas. Isso aconteceu após a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) aprovar o pedido de uma concessionária que venceu os leilões dos aeroportos de Belém e Macapá. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) também havia dado sinal verde para o uso desses ativos.
Divisão de opiniões
O uso de precatórios em concessões e outorgas é motivo de divisão dentro do próprio governo federal, apesar de estar previsto na Constituição. Alguns acreditam que isso não deveria ser permitido, principalmente para aumentar as receitas da União e reduzir o déficit público.
Por outro lado, o uso de precatórios pode ser uma maneira de diminuir o estoque de precatórios federais, que aumentou significativamente devido a mudanças implementadas pela gestão do ex-ministro da Economia Paulo Guedes. De acordo com dados de abril, o estoque atual chega a R$141 bilhões, podendo chegar a mais de R$300 bilhões em 2027, quando esses gastos passarão a afetar diretamente o orçamento da União.
Minuta rígida e consulta pública
Os responsáveis pela proposta comentam nos bastidores que a intenção de redigir uma minuta rígida é para permitir ajustes após receber contribuições das empresas interessadas e do próprio governo federal. Os interessados em sugerir alterações tiveram dezesseis dias para fazê-lo, pois a consulta pública estava prevista para durar até o dia 24 de junho, mas foi prorrogada até 30 de junho.
A proposta também estabelece que o governo definirá “condições e limites” para a aceitação dos precatórios, com o objetivo de garantir o cumprimento de objetivos regulatórios em sua competência.
Exigências e garantias
A proposta inclui exigências em relação às garantias para o uso de precatórios. Os interessados poderão optar por três modalidades: depósito em dinheiro, fiança bancária e seguro-garantia. A apresentação de garantia não será necessária se o precatório resultar de um acordo judicial com a AGU ou envolver o pagamento de dívida tributária ativa.
Além disso, as informações relativas aos precatórios ofertados, incluindo a Certidão do Valor Líquido Disponível (CVLD) emitida pelo Poder Judiciário em nome do requerente, serão incluídas no Portal da Transparência.
Reações e perspectivas
Alguns especialistas expressaram preocupação com as limitações impostas pelo texto proposto. O limite anual para o uso de precatórios, a possibilidade de o órgão público restringir o pagamento a uma porcentagem da outorga total e a exigência de garantias foram apontados como pontos de preocupação. Essas restrições podem anular a vantagem que as empresas têm ao adquirir precatórios com deságio no mercado.
Embora haja críticas às regras propostas, é considerado positivo que o governo tenha aberto uma consulta pública sobre o assunto. Ter uma regulamentação é melhor do que deixar a questão sem definição, o que tem levado a um aumento no número de processos judiciais.
No setor de infraestrutura, por exemplo, o uso de precatórios para pagamento de outorgas é quase inexistente, mesmo havendo interesse das empresas. Um caso notório foi o do grupo espanhol Aena, que decidiu pagar a outorga da concessão do aeroporto de Congonhas em dinheiro, após desistir de usar precatórios devido à demora do governo em regulamentar a questão.
Há divergências de opinião sobre as regras propostas, mas é importante que o assunto esteja em debate público e que sejam estabelecidos procedimentos claros para tornar o uso de precatórios uma realidade, conforme garantido pela Constituição.