Você recebeu um precatório e notou que houve a retenção de 11% referente à contribuição do Plano de Seguridade Social? Se sim, este artigo é essencial para você. Vamos detalhar o que isso significa e como você pode contestar essa retenção, caso seja indevida.
A Lei n. 10.887/2004 regulamentou a contribuição do PSS, obrigatória sobre os vencimentos dos servidores públicos federais, ativos ou inativos. Essa contribuição tem o propósito nobre de garantir benefícios em situações como doença, adoção, invalidez, reclusão, proteção à maternidade, velhice, entre outros. No entanto, sua aplicação em precatórios pode ser controversa.
ORIGEM HISTÓRICA E EVOLUÇÃO
A contribuição para o Plano de Seguridade Social (PSS) no Brasil tem uma trajetória histórica interessante, marcada por várias transformações. Sua origem remonta às primeiras iniciativas de proteção social no país, que começaram com a criação das “Caixas de Aposentadorias e Pensões” (CAPs) nas primeiras décadas do século XX. Estas CAPs eram instituídas por empresas e destinadas a seus empregados.
Com o passar dos anos e a evolução das políticas sociais, o sistema previdenciário brasileiro foi se expandindo e se consolidando. A Constituição de 1988 representou um marco importante, estabelecendo um sistema de seguridade social amplo, que abrangia não apenas a previdência, mas também a assistência social e a saúde.
A contribuição do PSS, como conhecemos hoje, foi formalizada e teve suas regras definidas em legislações posteriores, como a Lei n. 10.887/2004. Essa lei estabeleceu as diretrizes para a contribuição dos servidores públicos federais, criando um mecanismo mais robusto e integrado para garantir os direitos previdenciários desses trabalhadores.
Ao longo dos anos, as autoridades ajustaram as regras de contribuição ao PSS para refletir as mudanças no cenário econômico e social do país, atendendo assim às necessidades de sustentabilidade do sistema previdenciário. Isso destaca a capacidade de adaptação do sistema às evoluções ao longo do tempo. Essas mudanças incluem ajustes nas alíquotas de contribuição e nas regras de cálculo dos benefícios, refletindo o dinamismo e a complexidade da gestão da seguridade social no Brasil.
PRECATÓRIOS E A RETENÇÃO DO PSS: O QUE DIZ A LEI?
Quando se trata do PSS em precatórios, a compreensão das alíquotas e da base de cálculo é fundamental. Segundo o art. 16-A da Lei n. 10.887/2004, a contribuição do PSS sobre valores oriundos de decisões judiciais é retida na fonte, no momento do pagamento, pela instituição financeira responsável.
A alíquota do PSS é o percentual aplicado sobre a base de cálculo para determinar o valor da contribuição devida. No contexto dos precatórios, geralmente, a base de cálculo é o valor total do precatório, mas há especificidades a serem consideradas:
- A alíquota aplicada para a contribuição do PSS pode variar dependendo de vários fatores, incluindo a natureza do precatório e a legislação vigente. Por exemplo, a alíquota padrão para a contribuição do PSS é de 11%, mas isso pode ser diferente em casos específicos ou de acordo com mudanças legislativas.
- A base de cálculo para a contribuição do PSS em precatórios é tipicamente o valor bruto do precatório. No entanto, é importante notar que certas parcelas do valor total do precatório podem estar isentas da contribuição. Por exemplo, verbas indenizatórias ou componentes do precatório que não são considerados rendimentos tributáveis podem ser excluídos da base de cálculo.
- Para calcular a contribuição do PSS sobre um precatório, primeiro identifica-se a base de cálculo apropriada, excluindo quaisquer valores isentos. Em seguida, aplica-se a alíquota de 11% (ou outra, conforme aplicável) sobre essa base. Por exemplo, se considerarmos um precatório de R$ 100.000 e aplicarmos todo o valor como base de cálculo, a contribuição do PSS seria de R$ 11.000.
É crucial estar ciente de quaisquer exceções ou considerações especiais que possam afetar a alíquota ou a base de cálculo. Decisões judiciais, mudanças na legislação ou características específicas do precatório podem influenciar esses aspectos.
A Orientação Normativa n. 01 do Conselho de Justiça Federal estabelece que cabe ao juízo da execução determinar, em cada caso, a incidência da contribuição para o PSS. Porém, na prática, se o advogado não questionar, e se o desconto da contribuição estiver presente no Ofício Requisitório, ela será retida automaticamente.
Dessa forma, os beneficiários de precatórios devem revisar cuidadosamente o cálculo da contribuição do PSS para garantir que ele esteja correto. Se houver dúvidas ou discordâncias em relação à aplicação da alíquota ou à determinação da base de cálculo, é aconselhável buscar orientação legal para possíveis contestações.
OS PROBLEMAS NA PRÁTICA: RETENÇÃO INDEVIDA E DESINFORMAÇÃO
Muitas vezes, tanto advogados quanto contribuintes aceitam a retenção do PSS como definitiva, não contestando a indevida retenção. Contudo, o STJ, nos autos do Recurso Especial n. 1.266.616/RS, de Relatoria do Ministro Humberto Martins, já decidiu que é possível defender a não incidência do PSS durante a execução (cumprimento) da sentença ou através de uma ação de repetição de indébito.
Nesse caso, aconselhamos vocês a consultarem um(a) advogado(a) para saber se é o caso de pleitear a não cobrança do tributo ainda no cumprimento de sentença. Ou, se for o caso, ajuizar uma nova ação para reaver a contribuição que foi descontada indevidamente.
O prazo para solicitar a restituição é de cinco anos a partir da data do recolhimento. Isto é, a partir da data em que recebeu o precatório ou RPV com o desconto de PSS. E há diversas teses jurídicas que suportam a restituição desses valores, por exemplo:
- Juros de mora: Estes não devem sofrer incidência do PSS, pois têm natureza indenizatória.
- Rendimentos não incorporáveis à aposentadoria: Contribuições sobre benefícios como auxílio alimentação ou moradia, por exemplo, não devem incidir.
- Verbas indenizatórias: Por sua natureza reparatória, estas verbas não devem ter a incidência do PSS.
- Valores devidos antes da Lei n. 10.887/2004: A contribuição deve respeitar o princípio da irretroatividade das leis tributárias.
- Indenizações de anistia: Têm natureza indenizatória e, portanto, não devem sofrer a incidência do PSS.
EXPLORANDO AS PRINCIPAIS TESES SOBRE A NÃO INCIDÊNCIA DA CONTRIBUIÇÃO DO PSS EM PRECATÓRIOS
Juros de mora e a contribuição do PSS:
A incidência do PSS não se aplica aos juros de mora recebidos por funcionários públicos. Estes juros são predominantemente créditos moratórios, considerados como compensação pelo atraso no cumprimento de obrigações pela União.
O desafio para o servidor ocorre ao tentar sacar os valores a que tem direito e a instituição financeira, automaticamente, retém um percentual como contribuição previdenciária sobre o total pago. As cortes superiores já estabeleceram um consenso de que consideram ilegal a retenção, afirmando que a contribuição para o Plano de Seguridade Social (PSS) não deve incidir sobre valores indenizatórios, como é o caso dos juros de mora.
Conforme o art. 404 do Código Civil de 2002, os juros moratórios visam a recomposição do patrimônio e possuem caráter indenizatório. Dado que não fazem parte do crédito principal, consequentemente, não se qualificam como receita salarial sujeita à contribuição social para o Programa de Seguridade Social dos servidores públicos. Dessa forma, não devem ser usados na base de cálculo para a alíquota do PSS.
Devido à lentidão do judiciário, os precatórios geralmente incluem cerca de 50% de juros moratórios, que são, na verdade, uma compensação justa ao credor, paga pelo devedor que atrasou o pagamento do capital devido, independentemente de prova de prejuízo. Se o servidor público não contribuiu para o atraso no pagamento, nos termos do art. 396 do Código Civil, não deve haver incidência da contribuição do PSS sobre os juros, especialmente ao se considerar que não há previsão legal para sua incidência.
Logo, no cálculo da contribuição para o PSS, não se deve incluir os juros de mora relacionados a verbas salariais pagas conforme decisão judicial. A tributação só deve ocorrer sobre o valor original devido, conforme definido no julgamento em regime de recursos repetitivos no Recurso Especial n. 1.239.203/PR.
Portanto, se o PSS foi recolhido sobre o valor total de uma RPV ou precatório depositado em conta, incluindo os juros de mora do crédito principal, houve tributação indevida. Nesse cenário, o servidor tem direito à restituição do valor pago a mais, o qual deve ser devolvido de forma atualizada.
Assim, caso seja identificado que a retenção do PSS foi feita indevidamente sobre valores recebidos da União Federal como verba remuneratória, é necessário restituir o valor indevido. Esse montante corresponde aos 11% cobrados indevidamente como contribuição previdenciária sobre os juros de mora.
Rendimentos não incorporáveis à aposentadoria:
A Previdência Social é uma ferramenta essencial de política social do governo. Seu objetivo principal é preservar o nível de renda do trabalhador em situações de adversidade ou aposentadoria. Ela inclui seguros sociais destinados a oferecer proteção em diversos cenários, como velhice, doença, invalidez, oferecendo benefícios como aposentadorias, pensões, auxílio-doença e auxílio-acidente do trabalho, entre outros.
Conforme estabelecido no artigo 1º e seu parágrafo da Lei n. 9.783/1999 (posteriormente revogada pela Lei n. 10.887/2004), a contribuição social do servidor público para a manutenção de seu regime previdenciário era calculada com base na totalidade de sua remuneração. Isso incluía o vencimento do cargo efetivo e vantagens pecuniárias permanentes estabelecidas por lei, excluindo itens como diárias para viagens (até 50% da remuneração mensal), ajuda de custo por mudança de sede, indenização de transporte e salário família.
Em decisão baseada nos arts. 40, §§ 3º e 12, e 201, § 11, da Constituição Federal, no julgamento do RE n. 593.068/SC, o Supremo Tribunal Federal (STF) estabeleceu que os benefícios como adicional de férias, salário família, auxílio creche, funções gratificadas, auxílio alimentação, entre outros direitos previstos Constitucionalmente, não integram a remuneração do cargo público e não são incorporados à aposentadoria. Portanto, não estão sujeitos à incidência do PSS.
Antecipando-se ao STF, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já havia alinhado sua jurisprudência a este entendimento. Sob o regime de recursos repetitivos, o STJ decidiu que a contribuição para o PSS deve incidir apenas sobre as parcelas que se incorporam aos proventos de aposentadoria, excluindo-se tanto as verbas indenizatórias quanto as remunerações de caráter não incorporável[1].
É importante pontuar que as gratificações como o 13º salário, o adicional de 1/3 sobre a remuneração de férias e o pagamento de horas extras, que são direitos assegurados pela Constituição tanto a empregados quanto a servidores públicos, além de adicionais de caráter permanente, são considerados parte da remuneração. Consequentemente, estão sujeitas à contribuição previdenciária, uma vez que fazem parte da renda do trabalhador.
Verbas indenizatórias:
O conceito de indenização está intrinsecamente ligado ao ato de compensar danos e lesões experimentados. As verbas indenizatórias têm como propósito fundamental proporcionar reparação ou atenuar as adversidades enfrentadas pelo trabalhador, visando resolver as dificuldades surgidas entre as partes envolvidas.
Entre as formas mais comuns de verbas indenizatórias, destacam-se aquelas relacionadas a acidentes de trabalho, compensações por anistia (tanto política quanto referentes ao período do governo Collor), licenças-prêmio não utilizadas, aviso prévio, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), benefícios como vale transporte e alimentação, além do seguro-desemprego.
Importante ressaltar que a Primeira Seção do Tribunal Superior, ao analisar o REsp n. 1.239.203/PR, estabeleceu um marco legal importante: apesar de ser admissível a incidência de contribuição social sobre diversas vantagens recebidas por servidores públicos federais, tal contribuição não se aplica às parcelas de natureza indenizatória, dado que estas não se incorporam aos salários ou proventos.
Valores devidos antes da Lei n. 10.887/2004:
A contribuição do PSS, conforme estabelecido na Lei n. 10.887/2004 e alterações subsequentes, não deve incidir sobre valores de precatórios devidos antes da sua vigência, a fim de que seja respeitado o princípio da irretroatividade das leis tributárias.
O art. 16-A da Lei n. 10.887/2004, modificado pela Medida Provisória n. 449/2008 e posteriormente transformado na Lei n. 11.941/2009, estabeleceu um mecanismo de retenção na fonte no ato do pagamento. Este mecanismo visa aplicar a contribuição para o Plano de Seguridade Social (PSS) sobre determinadas parcelas, conforme as situações especificadas, seguindo o regime de competência.
É importante destacar que, antes da publicação da MP n. 449 no Diário Oficial da União em 4 de dezembro de 2008, a cobrança do PSS sobre os valores de precatórios não era praticada, em respeito ao princípio da isonomia e ao art. 150, III, “a”, da Constituição. Isso porque este artigo veda a cobrança de tributos sobre fatos geradores que ocorreram antes da vigência da lei que os instituiu ou aumentou, respeitando o princípio da irretroatividade da lei tributária.
Consequentemente, calcule a contribuição para o PSS mensalmente, levando em conta as normas vigentes na data em que as parcelas deveriam ter sido pagas. A incidência ocorre somente após a instituição da obrigação tributária.
Favorecendo os contribuintes, a maioria das decisões judiciais, mesmo considerando as mudanças introduzidas pela MP n. 449/2008, reconheceu que seus efeitos só poderiam ser aplicados a serviços prestados após a sua publicação, ou seja, a partir de 4 de dezembro de 2008.
Entretanto, segundo a interpretação pacificada da Receita Federal, expressa no § 6º do art. 10 da Instrução Normativa n. 2.097/2022, a contribuição do PSS não incide sobre valores relacionados a aposentadorias ou pensões recebidos por decisão judicial, oriundos de créditos gerados antes de 20 de maio de 2004.
Indenizações de anistia:
Existe uma jurisprudência consolidada nos tribunais superiores brasileiros que reconhece os valores destinados à reparação econômica de anistiados políticos, incluindo os demitidos durante o período Collor, como tendo natureza jurídica indenizatória. Isso significa que esses valores não estão sujeitos à Contribuição para o Plano de Seguridade Social (PSS), como estabelecido em diversas decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Tanto para anistiados que recebem compensação econômica em parcela única quanto para aqueles que a recebem em prestações mensais, contínuas e permanentes, o caráter é indiscutivelmente indenizatório. Devido a essa natureza, tais valores estão isentos tanto do imposto de renda quanto da contribuição previdenciária. Este entendimento foi reforçado pelo STJ no Mandado de Segurança n. 19.521/DF, relatado pelo Ministro Herman Benjamin em 14 de outubro de 2013.
CONCLUSÃO: SEU DIREITO À RESTITUIÇÃO
Se você se enquadra em qualquer um desses casos, pode ter direito à restituição. Fique atento e busque a orientação jurídica adequada para garantir que você respeite seus direitos. Entender seus direitos é o primeiro passo para assegurar que você receba o que é devido, mesmo que os precatórios possam ser complexos.
Caso você suspeite de tributação indevida, busque orientação profissional sem hesitar. Lembrando sempre: o conhecimento é a chave para defender seus direitos!
[1] Alguns dos precedentes importantes nesse sentido incluem o REsp 1.239.203/PR, relatado pelo Ministro Mauro Campbell Marques e publicado no DJe de 1º de fevereiro de 2013; o AgRg no REsp 1.366.263/DF, relatado pelo Ministro Humberto Martins e publicado no DJe de 6 de setembro de 2013; e o AgRg no REsp 1.056.203/DF, relatado pelo Ministro Sérgio Kukina, publicado no DJe de 6 de abril de 2015.