Entre as várias mudanças da PEC dos Precatórios, estão as alternativas criadas pela União para quitar dívidas de formas distintas ao pagamento convencional.
Uma delas é o acordo direto. Embora esteja presente no texto constitucional, que passou a vigorar com a aprovação PEC, os credores ainda não se sentem seguros com essa opção. Afinal, eles ainda não têm informações concretas de como funcionaria.
No artigo de hoje, vamos falar sobre a possibilidade de compensação de dívidas e compra de ativos com precatórios, além das expectativas dos credores com a regulamentação desses recursos. Continue conosco!
PEC dos Precatórios alterou as regras
Antes de falar das alternativas de uso, precisamos relembrar as principais alterações da PEC dos Precatórios. Sem dúvida, essa PEC representa a mais profunda alteração nas regras dos créditos desde a redemocratização, em 1988.
Foram várias as mudanças, especialmente em relação ao pagamento. A principal foi a determinação de um limite anual. Até então, o governo federal quitava suas dívidas todos os anos — seguindo a fila de precatórios — por meio da Lei Orçamentária Anual (LOA).
Com as Emendas Constitucionais promulgadas após aprovação da PEC, há um teto. Desse modo, os precatórios que estiverem na fila e não puderem ser pagos, serão remanejados para o ano seguinte e assim sucessivamente. Isso, por sua vez, pode provocar um verdadeiro efeito bola de neve.
Em alerta sobre a possibilidade de criar dívidas ainda maiores, a União argumenta que as outras alterações da PEC podem amenizar o efeito bola de neve, diminuindo o estoque de precatórios por vias alternativas.
Uma delas é o acordo direto. Ou seja, credores que não querem correr o risco de ficar sem previsão de pagamento têm a opção de receber o valor antes, mas com desconto. Outro meio é o encontro de contas, que apresentaremos melhor no tópico seguinte.
O que é encontro de contas?
Digamos que você fez um empréstimo de R$200 com o seu vizinho e combinou o pagamento para o mês seguinte. Porém, um tempo atrás, você e o mesmo vizinho foram a um bar. Na ocasião, ele estava desprevenido, então você pagou a conta de R$150 sozinho.
Sabendo disso, antes do vencimento da sua dívida, o vizinho propõe que você desconte o valor do bar no que deve. Assim, sua dívida passa a ser de apenas R$50. E você pode quitá-la antecipadamente. Então, o encontro de contas é um acerto entre o valor devido pelo ente federativo e possíveis valores que o credor tenha com esse mesmo ente. Seria uma forma de compensação, como no exemplo.
Digamos que uma empresa tem uma dívida com a União, mas também tem um precatório a receber. Dessa forma, ela poderia utilizar o valor desse crédito para abater possíveis dívidas de impostos federais, por exemplo.
Seria uma forma de utilizar o precatório, sem necessariamente receber o dinheiro. Mas o que pode ser compensado? É dessa regulamentação que se queixam os credores, em especial quem tem precatórios federais.
PEC dá liberdade para regular uso de precatórios
A possibilidade de compensação pode ser aplicada em qualquer esfera da administração pública — federal, estadual ou municipal. O único impedimento é que o precatório só pode compensar dívidas que o credor tenha no mesmo local. Por exemplo, o beneficiário de um precatório estadual de Minas Gerais só pode usar esse crédito para amortizar dívidas com o estado mineiro.
Cabe a cada ente federativo regulamentar o modo como os precatórios podem ser utilizados na hipótese de compensação. Essa liberdade permite que o estado ou município determine o percentual a ser considerado na compensação, quais dívidas podem ser compensadas, se juros ou multa entram no acordo e por aí vai.
Alguns estados, como São Paulo, já têm leis próprias regulando como se dará a compensação de dívidas com precatórios, além de outras utilizações por parte dos credores.
União ainda não tem regulamento
De acordo com a PEC dos Precatórios, no caso da União, não seria necessária uma legislação específica para regulamentar a compensação de dívidas. Mesmo assim, especialistas entendem que sem isso o cenário gera insegurança jurídica, já que não é possível dizer como seriam as transações.
Digamos que uma empresa tem um precatório federal no valor de R$100.000. Essa mesma empresa deve, em impostos federais, o equivalente a R$90.000. Somente com base no texto da PEC, não é possível dizer se ela pode quitar toda a sua dívida fiscal com a União utilizando o crédito que tem a receber.
Outra questão é saber se essa dívida fiscal pode ou não ser quitada com o precatório ou se há restrição dependendo do tipo de débito. Em resumo, os credores aguardam que a União determine os limites e as regras da compensação com clareza, para que eles possam utilizar o recurso quando necessário.
Credores também podem comprar ativos estatais
Além de compensar dívidas, o beneficiário de um precatório também pode utilizar o crédito para outra finalidade. A PEC abriu a possibilidade para o dono do crédito de comprar imóveis públicos, direitos disponibilizados para cessão e pagamento de outorga de serviço público. O credor também pode adquirir ações vendidas em processos de privatização.
Entretanto, todas essas opções carecem de melhor regulamentação. Seja como for, são alternativas para que o credor possa utilizar o precatório e receber o crédito de forma indireta.
Governo tenta reduzir estoque de precatórios
Todas as possibilidades que vimos até aqui fazem parte de uma estratégia do governo de diminuir o estoque de precatórios no Brasil sem ter que quitar as dívidas efetivamente.
Segundo o Mapa Anual dos Precatórios do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o volume de precatórios soma quase R$200 bilhões. Somente em 2022, estima-se que as alterações promovidas pela PEC acrescente a esse montante cerca de R$45 bilhões, que ficam de fora dos pagamentos previstos.
Embora pareça uma boa alternativa para ter acesso ao crédito de forma antecipada, as possibilidades de compensação dos precatórios ainda precisam de maior clareza do poder público. Além disso, o próprio texto das Emendas Constitucional, aprovadas após a PEC dos precatório, segue com questionamentos no Supremo Tribunal Federal (STF), sob a alegação de que as alterações são inconstitucionais. A ministra Rosa Weber, relatora do caso, aguarda a manifestação da Câmara dos Deputados, Senado Federal e do presidente da República sobre o tema.
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