Durante o seminário “Diálogo entre os três poderes pela retomada econômica do Brasil”, organizado pelo Instituto de Estudos Jurídicos Aplicados (IEJA), no dia 8 de dezembro, o ministro da Economia causou polêmica ao falar sobre precatórios.
Diante de autoridades do Supremo Tribunal Federal (STF), Congresso e representantes do governo, Paulo Guedes afirmou: “O Brasil vai ser destruído por uma indústria predatória de precatórios. Quem está fazendo isso? Aí há várias possibilidades. Primeiro, a legislação é obsoleta. Está se criando passivos de uma forma não razoável. É uma hipótese”.
Guedes disse que o Congresso deve revisar as regras a fim de diminuir os custos dos precatórios. Além disso, o ministro insinuou que outra hipótese para o aumento do passivo é a de “alguém estar fazendo alguma besteira” para ganhar dinheiro, sem mencionar nomes.
As declarações causaram grande estranheza, e receberam críticas de advogados, juristas e economistas, preocupados com o tom do ministro, bem como as suas intenções, cada vez mais claras, de não pagar precatórios. Continue a leitura para entender os impactos disso!
Precatórios são dívidas do poder público
Se você acompanha os nossos artigos no blog, já sabe que precatórios nada mais são do que dívidas do poder público com um cidadão ou empresa. Essas, por sua vez, são determinadas por meio de processos judicias. Após perder a causa, o ente devedor é obrigado a indenizar o credor.
Quando o acerto de contas ultrapassa certo limite, ele se torna um precatório. Ou seja, um título que confere ao credor o direito de receber aquela quantia no prazo descrito.
Em caso de entes públicos federais — seja a União, empresas públicas federais ou autarquias — a dívida recebe o nome de precatório federal, enquanto o pagamento é realizado a partir da lista da LOA. De acordo com o descrito na Constituição, esses títulos judiciais vêm sendo pagos em dia. Durante o governo atual, no entanto, a ameaça de calote tem se tornado constante.
Governo já ameaçou calote no pagamento de precatórios
Em pelo menos dois momentos, o governo federal sugeriu limitar o pagamento de precatórios com o intuito de financiar outros projetos. O primeiro deles diz respeito ao programa Renda Cidadã, enquanto o segundo tem a ver com a lei de parcelamento dos títulos judiciais.
Renda Cidadã
Com a expectativa de deixar uma marca em sua administração, o presidente Jair Bolsonaro anunciou, em setembro, o programa social Renda Cidadã. Seu objetivo era substituir o Bolsa Família e funcionar como uma ampliação dos programas existentes, além de ser uma extensão do auxílio emergencial empregado durante a pandemia.
Para isso, o governo cogitou a possibilidade de limitar o pagamento de precatórios. Dessa forma, parte dos recursos poderia ser utilizada com o intuito de financiar o novo programa social.
A proposta, porém, recebeu inúmeras críticas, tantas que o governo se viu obrigado a recuar. Já na época, deixar de pagar precatórios era visto como calote, o que impactaria o mercado financeiro e as avaliações de risco da economia.
Lei de parcelamento de precatórios
No mesmo mês, o governo sancionou uma nova lei — a lei nº 14.057 — que regulamentava a possibilidade de acordos para precatórios federais. O formato é uma alternativa para que o credor possa receber o seu precatório de forma adiantada, com um desconto.
Mesmo que a possibilidade já esteja descrita na Constituição, a intenção do governo de criar uma lei específica para o acordo dos precatórios federais sinalizou uma tendência de atraso nos pagamentos.
Há 20 anos, os precatórios federais não são atrasados. Sendo assim, não faria sentido para o credor negociar um acordo com o seu precatório, deixando de receber até 40% do valor, e parcelando a dívida. Afinal, ele sabe que, se quisesse, poderia receber o total dentro do prazo estipulado.
Ao propor a possibilidade de acordo, o governo criou um ambiente de especulação, o que elevou o nível de insegurança do mercado.
Declarações de Paulo Guedes recebem críticas
Uma vez que são dívidas do governo, os precatórios acabam sendo também uma demonstração de saúde financeira. Um governo equilibrado e de economia saudável paga os seus débitos em dia. Então, para o mercado financeiro e o cenário econômico no geral, é um sinal positivo e estimulante, podendo beneficiar os investimentos.
Ao levantar dúvidas sobre a condição da União de quitar essas dívidas em dia ou até mesmo a legitimidade dos precatórios, o ministro Paulo Guedes acaba criando uma ambiente inseguro. Isso causa medo em credores que têm valores a receber, além de incertezas em um mercado que tem o precatório como moeda de investimento.
Essa foi uma das críticas feitas à declaração de Guedes, que também levantou suspeita sobre o próprio processo de decisão judicial, no qual se origina um precatório.
“Indústria de precatórios”
O termo “indústria de precatórios”, utilizado pelo ministro Guedes, foi um dos que mais causou indignação na comunidade jurídica. Quando se fala em “indústria”, o sentido é da produção mecânica de algo, em máxima escala. Associar esse sentido a uma decisão judicial — como é o caso de um precatório — dá a entender que a justiça tem fabricado precatórios de modo proposital e sem critério, apenas para aumentar a dívida do governo.
A comparação, segundo advogados e juristas, beira o absurdo, já que um precatório nada mais é do que um dever do estado. Portanto, não é, nem de longe, uma decisão autoritária da justiça. Nesse mesmo contexto, diante da alegação do ministro da Economia sobre o aumento nos valores de precatórios, cabe ressaltar o fator do tempo de julgamento.
Durante o período em que se julgam os recursos apresentados pela defesa, até que a decisão seja finalmente proferida e o martelo batido quanto ao dever de indenizar, correm juros, atualizações monetárias e moratórias. Tudo isso é agregado ao valor final do precatório. Portanto, a variação do montante a ser pago pelo governo sofre aumentos graduais em função dessas correções, e do prazo de postergação da decisão.
Inovações no sistema de julgamento
Há de se falar também que processos informatizados e sistema de inteligência eletrônica, bem como julgamentos em blocos de litígios, fizeram com que os números de processos julgados pela justiça aumentassem, o que implica em um número maior de precatórios.
Quanto mais processos são abertos contra o governo a fim de buscar indenização, mais a justiça se esforça para dar solução, o que pode resultar em novos precatórios. Assim, inovações no sistema de julgamento também contribuem para o aumento.
Mercado de precatórios está receoso
Enfim, as declarações do ministro Paulo Guedes causam insegurança no mercado financeiro como um todo — especialmente no mercado de precatórios — um ativo muito solicitado para investimentos, compra e venda.
Aliás, a venda de precatórios movimenta todo um mercado, que investe nesses títulos e espera mínima previsibilidade de pagamento. Ao levantar dúvidas sobre a condição do governo de pagar, principalmente quando se trata de precatórios federais — os quais há 20 anos têm sido pagos rigorosamente em dia — é natural que o mercado se mostre receoso.
As declarações do governo têm deixado muitos credores receosos, sem saber se receberão ou se algum tipo de mudança virá para atrasar pagamentos. Estamos sempre atentos para informar sobre qualquer fato que interfira na dinâmica dos precatórios. Também queremos lembrar que, diante desse cenário, a venda do seu precatório é sempre uma opção viável para ter o dinheiro na mão, sem precisar lidar com essa incerteza.
Então, qual é a sua opinião sobre o tema? Conte aqui nos comentários o que achou das declarações do ministro Paulo Guedes. Até a próxima!